sexta-feira, 17 de julho de 2009

Lugar de criança é na gafieira

Em mais uma das minhas pesquisas sobre a dança, achei essa matéria da Revista Época. E pode ter certeza... tudo que está escrito aí é a mais pura verdade. Foi-se a época em que meninas iam direto para o ballet clássico e os meninos para a escolinha de futebol... Boa leitura!

Lugar de criança é na gafieira

Jovens de seis a 16 anos descobrem os prazeres da dança de salão e enchem as academias
De: Marcela Leone

Foi-se o tempo em que dança de salão era hábito da terceira idade. As crianças invadiram as academias e elegeram a dança como atividade física. Bolero, samba, soltinho e forró ganharam ainda mais charme e rostos - ou melhor, pernas - muito mais jovens. No final de 1998, a professora de dança Lu Leite começou a ensinar adultos e crianças da comunidade do morro Dona Marta, no Rio. Mas brigas entre gangues e problemas com o tráfico constantemente fechavam a quadra que servia de sala de aula. Isso desestimulava as crianças.
Há três anos, o dançarino Jaime Arôxa cedeu um espaço em sua academia e batizou o projeto com o nome Bem dos Pés à Cabeça. Lu diz que as aulas fora da comunidade aumentaram o interesse das crianças, que eram apenas 30 no início. Mesmo sem qualquer patrocínio, hoje são mantidos 150 alunos - não apenas de comunidades carentes - com idades entre seis e 16 anos e que fazem quatro horas de aula gratuita por semana. Jorge Luiz, Jéssica Cristina, Thasio e Thiago Souza foram levados à academia pelos avós, que dançam desde 1996. "No começo, ensinávamos os passos básicos a eles. Agora são eles quem nos ensinam", diz Miriam Gama, a avó coruja, que guarda fitas de vídeo e um álbum com fotos e reportagens que mostram os netos em ação. "Queria dançar como eles", confessa.
Jéssica começou a dançar aos seis anos, época em que meninas e meninos preferem manter uma longa distância entre si. "Sentíamos um pouco de vergonha em dançar com os meninos e olhar nos olhos deles. Depois acostumamos", conta Jéssica, hoje com 9 anos. Manoel Gama, o avô, ressalta a facilidade com que as crianças aprendem. "Elas assistem a apresentações de profissionais e conseguem fazer todos os passos depois, inclusive os mais complexos". Em casa, ensaiam com os avós ao som de discos antigos de bolero. Segundo as crianças, seis meses foram suficientes para superar as dificuldades iniciais, como conduzir a dama - no caso dos meninos - e seguir o ritmo da música. Hoje, os quatro estão entre os 16 alunos que integram a companhia mirim do Centro de Dança Jaime Arôxa e fazem apresentações fora da academia. Já estiveram em programas da Rede Globo, da TVE e da Band.
O projeto Bem dos Pés à Cabeça inclui ainda aulas de balé. Os meninos não se incomodam, pois sabem que isso é fundamental para a formação deles como dançarinos. Jorginho, 11 anos, conta que riam de tudo nas primeiras aulas. Seu primo Thiago, de 13, ressalta a importância do balé: "Nos ajuda a ter postura e equilíbrio". Ao completarem 17 anos, os alunos são indicados para auxiliar os professores nas aulas. "Muitos querem ser bolsistas antes, mas isso exige uma grande responsabilidade", diz Lu. "É importante que eles dêem prioridade aos estudos". Tiago Lima é uma das raras exceções. Ele tem 14 anos e já é bolsista, mas confessa ter achado chata a primeira apresentação de dança de salão à qual assistiu. A primeira impressão pode não ser a melhor, principalmente porque existe um tabu que associa a dança à gente antiga. "As pessoas acham que dança de salão não é para jovens. Além disso, ninguém quer dançar junto hoje em dia. Todos querem se sacudir sozinhos", diz Marco Antonio Jamayka, professor do projeto.
Entre as crianças, o preconceito não existe. Os amigos aprovam a atividade e pedem para ir junto à aula de dança. A curiosidade talvez surja justamente porque os alunos do projeto fogem à regra das atividades físicas infantis: meninas só fazem balé e meninos só jogam futebol. "Enquanto a maioria dos meus amigos fica correndo atrás de bola, eu fico junto das mulheres", brinca Thasio, 12 anos.Os professores não incentivam os alunos a freqüentar bailes, pois quase todos acontecem à noite. Mas todo dia 12 de outubro há uma festa preparada especialmente para a nova geração de dançarinos. Alguns meninos, como aqueles da mesma família, costumam ir a bailes com os avós. Já são conhecidos das senhoras freqüentadoras, que adoram dançar com eles.Todos, sem exceção, querem ser professores. Lu e Jamayka destacam que a dança pode dar aos jovens, principalmente os de comunidades carentes, a oportunidade de ter um futuro diferente. "Através das crianças será possível manter a dança de salão e sua coletividade, pois ao praticá-la dividimos momentos de prazer e felicidade", conta Jamayka. Ele se ofereceu para ajudar no Bem dos Pés à Cabeça porque sempre gostou de trabalhar com crianças. Hoje, diz que formam uma família. "O mais importante não é ensinar a dançar, mas arraigar na alma da criança o amor pela dança e a importância de estar sempre aprendendo".Outros lugares do Brasil também oferecem aulas especiais para crianças. A academia Toni Sá cobra R$20 por aluno e a Fábio Venturini, R$30. Na Casa de Dança Carlinhos de Jesus, que tem notas boas na escola assegura um desconto de 35% na mensalidade.

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